segunda-feira, 11 de março de 2013

Histórias e historietas com palavras, depois de ter lido "As pequenas memórias" e não só

Juntei as palavras que me puseram na mesa e construí a minha história. Sem pedra, sem jangada, sem intermitências. Só com palavras que fluíram naturalmente. Na minha casa também não havia livros, tal como na sua. As memórias que me assaltam tornam-nos parecidos e também são pequenas. Não havia O Século, nem Dolfuss, nem o Diário de Notícias, nem semanários como o Sempre Fixe. Nada. Nem a forrar paredes. Só a Bíblia que herdei do meu avô, felizmente alfabetizado, apesar de ter também nascido no século XIX, como o seu, que me lia as histórias do evangelho, quando estava frio. Jesus, Caim, Parábolas, palavras que fui ouvindo. Mas, ao contrário de si, não aprendi a ler sozinha, tive ajuda; primeiro tive a chamada "escola paga", particular; depois a pública.  E consegui estudar até à Universidade, em Lisboa, porque tive a força suficiente e a persistência de dizer que QUERIA (trabalhei um ano inteiro, pedi bolsa). O meu pai, também José, nunca pôde estudar mais do que a 3ª classe, com a professora regente; gostava de ler, mas estava proibido pelo médico por causa da miopia. Teve de trabalhar no campo, para ajudar a família.
O campo foi sempre um espaço mítico, de refúgio, até hoje. Sobretudo para o meu pai. Para mim também. Conheço as árvores, as pedras, o vento, as plantas, o céu. Continuo a ter a casa desse avô e a minha, as duas próximas uma da outra. Empreendemos sempre essa viagem, várias vezes ao ano: um presente que foi passado e há de ser futuro.
Na prática somos duas pessoas numa só: duplicamo-nos, umas vezes estamos na cidade, pouco vemos; outras vezes estamos num espaço paradisíaco, o mesmo que nos acompanhará toda a vida e cada instante dura a eternidade. Nem uma só uma vez a palavra "morte" nos assusta quando ali estamos. Fazemos parte da paisagem. Com ela os animais: para sempre os gatos, os cães; na memória as galinhas, os patos, as burras (as duas, a Mimosa e a Carocha).Ao contrário dos seus avós, nunca gostei de porcos, tivemos poucos (só foram mais quando o meu pai era pequeno, também os vendiam). Choravam quando morriam, era um espetáculo que nunca esquecerei.
Os nossos nomes têm sempre uma razão: o senhor herdou uma alcunha de família - Saramago- ; a mim deram-me (a minha madrinha) o nome da minha avó e um dos nomes do meu pai - Martins. O meu pai tinha um nome igual ao seu e um outro que nunca foi dele - Vítor (mas do meu avó). Era o Zé do Vítor e ficou sendo Zé Vítor. Gosto dos nomes das suas personagens, das que têm nome. Sobretudo de Tertuliano Máximo Afonso. E de José, de Todos os Nomes. Mas gosto sobretudo dos topónimos portugueses- como  Amendoais, no Algarve, a minha terra. Tão bonito como Azinhaga, não acha?

Amendoeiras em flor

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